sexta-feira, 25 de outubro de 2013

   Acidente de trem no túnel dos Órgãos

Túnel da Beira Linha, em direção ao Alto

     Em exposição nos jardins da Casa da Memória Arthur Dalmasso, um trenzinho vem provocando a atenção de quem passa pelo local, inclusive de alunos que vão em grupo ao importante espaço cultural para conhecer melhor a história do trem da Estrada de Ferro Teresópolis.

     Embora já tenha parado de circular há mais de 50 anos, o trem ainda está na memória do teresopolitano e, nos mais novos, desperta grande interesse. Contada de forma lúdica, nos painéis que revestem os cenográficos vagões, a história do trem revela como ele foi chegando, aos poucos, às estações de Magé, de Guapimirim e da Barreira, mostrando como foi difícil a construção da estrada e como era, também, difícil a viagem ao Rio de Janeiro, composta de baldeações entre os trens, sem contar a passagem pelo mar, travessia feita em improvisadas embarcações.


     Entre os painéis, um conta a história dos acidentes da nossa estrada de ferro, todos eles ocorridos a partir da encampação da EFT pelo governo federal, em 1919, justamente quando a empresa do modesto empreendedor José Augusto Vieira já se mostrava deficitária e carente de investimentos. 


     Foram vários acidentes, destacando-se o descarrilhamento de março de 1930, na serra, quando morreram 8 pessoas, e o de março de 1940, quando outros 16 passageiros perderam a vida num choque de trens. Um curioso acidente, de uma vítima apenas, no entanto, é o caso que pretendemos contar hoje. Ele ocorreu no túnel da Beira Linha e a memória dele teria sido perdida não fosse uma entrevista do maquinista Pedro de Jesus, publicada no livro “A Estrada de Ferro Therezopolis”.


     “Antônio Virgínio, em substituição ao seu colega, o maquinista Innocencio Virginio, conduzia a máquina N.o 1, com destino à Estação da Várzea, trazendo dois carros que deviam transportar os passageiros das 4h55 da tarde, quando o eixo da locomotiva partiu-se, indo, assim, a composição, com a velocidade em que andava já fora dos trilhos, de encontro a uma barreira, imprensando o infeliz empregado da ferrovia, que teve a perna quebrada em duas partes; a direita bastante magoada, e a barriga e o braço esquerdo horrivelmente queimados pela água fervendo que se derramava da caldeira”.


     Publicada no jornal “O Therezopolis” do dia 23 de dezembro de 1928, a nota dá conta do primeiro de uma série de acidentes com vítimas fatais envolvendo os trens de Teresópolis. Tragédia pessoal da família Virgínio, envolvendo Antonio e Inocêncio - um tinha substituído o outro na tarefa de trazer a locomotiva da estação do Alto à Várzea -, o acidente aconteceu na tarde de uma sexta-feira, dia 14, entre Araras e a Várzea”. Conhecido como o acidente do túnel, o jornal não informa se ele aconteceu próximo ou dentro do túnel, nem, se ambos com o sobrenome Virgínio, qual seria o grau de parentesco entre Innocêncio e Antônio.


     “Eram irmãos”, informou o maquinista Pedro de Jesus. Pedro contou ainda sobre um inusitado episódio, ignorado, inclusive, pela imprensa, que envolveu outra máquina da EFT. “Em 1945, aconteceu um acidente próximo à ponte do Garrafão. O maquinista Antonio Alves de Abreu, quando foi engatar a segunda cremalheira, “soltou e espigou” o maquinista Paulo Bragança, que morreu imprensado contra uma pedra. Eles estavam trazendo serra acima uma máquina plana, empreitada que exigia três cremalheiras”. Segundo Pedro, a locomotiva plana pesava em torno de 38 toneladas e precisava ser dividida em duas partes para facilitar o transporte. - “Duas máquinas cremalheiras traziam a parte mais pesada e uma terceira máquina, a parte de trás da locomotiva. Na ponte, tinha que passar uma cremalheira por vez, por causa do peso, foi quando aconteceu o acidente, ao refazer o engate”, informou Pedro, que contou ainda como uma outra cremalheira se perdeu na serra. - “Essa cremalheira parou na caixa d'água para abastecer. Deixaram a trava em posição errada e quando a água encheu o tanque, a pressão fez liberar o freio, desandando a máquina, que estava solteira, sem vagões. A tripulação não tinha o que fazer, senão pular da máquina que já ganhava velocidade. E a empresa não tinha como recuperá-la. Custaria uma fortuna guinchar a cremalheira do abismo, onde está até hoje”.


     Um dos sítios históricos mais importantes da Estrada de Ferro Therezopolis, e muito representativo para a memória do trem, bem tombado pela municipalidade, poucas informações existem sobre o Túnel da Beira Linha, originalmente chamado “Túnel dos Órgãos”. Lembrei de contar esse episódio do acidente na coluna de hoje mais para mostrar duas fotografias que ganhei de presente essa semana do leitor Fernando Luiz Barreto. Na verdade foi um pretexto que encontrei para compartilhar essas imagens inéditas, que mostram a entrada e a saída do nosso túnel da Beira Linha, coisa que poucos tiveram a curiosidade de registrar.