sábado, 1 de março de 2014

   UMA ESTRADA DE RODAGEM PARA PETRÓPOLIS

Nos anos 1930, era assim o caminho para Petrópolis - motivo de campanha pela recuperação da estrada
     Passando os olhos num exemplar de “O Therezopolis”, edição de 20 de março de 1932, vimos um interessante texto de primeira página, escrito pelo médico Armando Paracampo. Nele, o médico que deixou tantos exemplos de luta em prol do interesse coletivo em nossa cidade, relata o descontentamento do teresopolitano com as péssimas condições de tráfego da estrada “Therezopolis-Itaipava”. Conta, também, sobre uma campanha que estava sendo feita na cidade visando a recuperação desta rodovia - na época do trem, o caminho de Petrópolis era o único acesso a Teresópolis por automóvel.

     O texto vale ser reproduzido, de preferência, da forma como foi escrito. Vale, principalmente, para dar memória dos teresopolitanos da época, preocupados com o desenvolvimento da cidade: H. Sloper, Arnaldo Guinlle, José Ortigão, Cincinato Braga, Armando Vieira, H. Humpstone, Neele e Carlos Guinlle figuram na lista de contribuintes. - “Doaram 6 contos, necessitando a campanha ainda de outros 9 contos de réis”, reporta Paracampo. Além dos contribuintes, o médico e jornalista dá notícia ainda da comissão encarregada pela execução dos serviços. José Joaquim de Araújo Regadas, Francisco Smolka, Helvecio Serpa, José Ortigão e o próprio Paracampo cuidavam de arrecadar o dinheiro junto ao empresariado e da “direcção technica” dos trabalhos.

     A matéria mostra a responsabilidade que as pessoas daquela época tinham com a cidade onde moravam e tece severas críticas a quem não se aliava nas campanhas de interesses comuns e também aos governos estadual e federal. - “Não invocamos o auxílio da União e nem do Estado, para que venham consertar essa nossa estrada, porque, coitados, estão às portas da falência e da penhora!...”, observa Armando Paracampo, que dizia-se envergonhado de ter que esmolar junto aos ricos da cidade para uma obra que seria do benefício de todos. - “Infelizmente, é preciso suportar essa vergonha, porque é para benefício do Município, e para benefício de nós mesmos. E fosse somente essa a vergonha, essa a humilhação, por que passam os que estão angariando donativos e fundos para a conservação da estrada Teresópolis-Petropolis. Se não existissem também as indiretas, as gracinhas e até mesmo desaforos que somos obrigados a ouvir, aceitar e calar com paciência franciscana!...”, confessa, lembrando que é obrigação do cidadão mover-se, sacrificar-se pelo bem comum. - “Se nós mesmos nos não movermos e nos não decidimos a agir dessa maneira, para o bem comum, e para o nosso próprio bem, então é melhor que cada um arrume a trouxa, diga adeus e vá-se embora, a procura de outro lugar, onde melhor enterrar a sua fortuna, a sua atividade e o seu bem estar”, disse em tom de ameaça.

     Caminho carroçável aberto em 1898 pelo Coronel Claussen e reconstruído em 1920 pelos prefeitos de Teresópolis e de Petrópolis para a visita do Rei Alberto, da Bélgica, uma década depois, a estrada Teresópolis-Petrópolis estava em péssimo estado de conservação. E, cansados de apelar aos governos do estado e da capital e, à própria prefeitura, os teresopolitanos da época se cotizaram e resolveram fazer uma campanha pela sua recuperação, que representaria àquela altura prosperidade para o município. À frente dessa campanha homérica estavam os Guinlle Arnaldo e Carlos, Serpa, Sloper, Vieira e outros. Os mesmos que, em fevereiro de 1948, criaram a Sociedade dos Amigos de Teresópolis. Essa entidade - isso merece ser contado com detalhes - foi quem iniciou a abertura da estrada Teresópolis-Rio, sendo a empreitada encampada pelo governo federal anos depois, concluindo-se o serviço em 1959.

     O texto rememora uma época. Traz, ainda, conceitos de cidadania, de uma forma de viver em sociedade que não se pratica mais. Está desatualizado na grafia. Está desatualizado, também, contextualizando-o à atualidade: hoje, as pessoas praticamente só se associam para fins de lazer e, até da obrigação de fazer manutenção da calçada de sua propriedade o “cidadão” se esquiva.

     Um documento da história de Teresópolis, a publicação desse texto de meados do século passado serve para reavivar nossa memória. E, quem sabe, para nos provocar, incitando-nos a repensar nosso papel na formação do futuro do município.

   ESTRADA DE RODAGEM TERESÓPOLIS-PETRÓPOLIS
   Feita, ás pressas, para fim de turismo, a estrada Therezopolis-Petropolis transformou-se numa verdadeira estrada commercial.
   Ninguem desconhece os defeitos, as difficuldades as surprezas que essa estrada encessa. E todos podem bem avaliar como essas difficuldades augmentam quando se abandona a conserva do seu leito, sobretudo depois da estação chuvosa.
   E' uma estrada interessante e de bellissimo trajecto. Mas é uma estrada impropria para o transito de mercadorias e até mesmo para passeio. E' quasi uma estrada indesejavel.
   Mas... é uma estrada, e é o unico recurso que possuimos para nos mantermos em contacto com Petropolis, e por conseguinte, com o importante centro commercial que é o Rio de Janeiro.
   Por ella transitam diaramente caminhões e caminhões, e caminhões exportando e importando mercadorias. Só de Therezopolis, trafegam para o Rio, 15 caminhões, ao que estamos informados. Esses caminhões vão num dia e voltam no outro. Fazem seis viagens por semana, cada um, ou sejam, 90 viagens por semana ou 4.680 por anno, ao todo.
   Calculando uma carca media, para cada caminhão e para cada viagem, de 2.000 kilos, tomos que, por anno, são transportados e transitam pela estrada Therezopolis-Petropolis, apenasmente, 9.360.000 kilos de mercadorias, ou 10.000 toneladas a bem dizer.
   E si quizermos dar a cada kilo de mercadoria, o valor médio, ou mesmo inferior de 3$000, teremos qe por essa referida estrada, passa por anno, uma riqueza aproximada de 28.000:000$000 - Trinta mil contos!
   Essa estrada, portanto, embora de traçado pouco comodo e de accesso difficil, é uma estrada de importancia vital, para Therezopolis. Mesmo ruim como é.
   Pois bem, senhores!...
   Essa estrada está, ou melhor, estava a ponto de ficar com o transito interrompido, tal o estado deploravel em que se acha o seu leito, pela destruição systematica e impiedosa das aguas; pela absoluta falta de conservação e pelo não pequeno transito de caminhões.
   Estava a pique de ser fechada ao transito, e não, poucas vezes, esteve assim, embora pelo espaço de horas ou dias.
   Um grupo de amigos de Therezopois, decidiu, nestes ultimos dias, reconstruir a bem dizer alguns trechos dessa estrada e collocal-a em condições de bem servir o público, o commercio e principalmente a lavoura de Therezopolis, pois que é a lavoura que maior quantidade de mercadorias e cargas fornece para os caminhões.
   Esse grupo de amigos de Therezopolis, é claro, teve e tem que recorrer a outros bons amigos de Therezopolis afim de conseguir fundos necessarios para realizarem os indispensaveis concertos e reparos da referida estrada. 
   Na lista de subscriptores, que adeante vae publicada, os leitores poderão ver os nomes dos que verdadeiramente amam Therezopolis.
   Essa lista, porem, e esse pedido que é feito ás pessoas de boa vontade, como o único recurso que resta a Therezopolis para conservar a sua mais importante estrada de rodagem, representa uma vergonha e uma humilhação!...
   Não invocamos o auxilio da União e nem do Estado, para que venham concertar essa nossa estrada, porque, coitados, estão ás portas da falencia e da penhora!... O funding que é uma moratoria é o primeiro passo para a fallencia, e elle acaba de ser conseguido pela 3ª vez.
   Invocamos, isso sim, o auxilio da Prefeitura.
   Esse deve vir, e com certeza virá.
   A Prefeitura auxilia, actualmente esses serviços de reparos, com um caminhão, um chauffeur e algumas ferramentas. Achamos pequeno esse auxilio, tanto assim, que infelizmente, somos obrigados a estar esmolando auxilio de particulares, importunando-os, na verdade, com insistentes pedidos de dinheiro.
   Mas, si os poderes publicos estaduaes cruzam os braços deantes desse desastre do Municipio?
   Infelizmente, meu caro leitor, é preciso suportar essa vergonha, porque é para beneficio do Municipio, e para beneficio de nós mesmos.
   E fosse somente essa a vergonha, essa a humilhação, por que passam os que estão angariando donativos e fundos para a conservação da estrada Therezopolis-Petropolis. Si não existissem tambem as indirectas, as gracinhas e até mesmo desafôros que somos obrigados a ouvir, acceitar e calar com paciencia franciscana!
   Na verdade, ninguem nos obriga a tornarmos essa attitude.
   Mas, senhores!...
   Si nós mesmos nos não movermos e nos não decidimos a agir dessa maneira, para o bem commum, e para o nosso proprio bem, então é melhor que cada um arrume a trouxa, diga adeus e vá-se embora, a procura de outro logar, onde melhor enterrar a sua fortuna, a sua actividade e o seu bem estar.
   Para se recollocar a estrada Therezopolis-Petropolis em bôas condições de transito, serão necessarios de 14 a 15 contos. Já estão subscriptos perto de 6 contos. São precisos, portanto, ainda uns 9 contos, pelos menos.
   Será que o publico de Therezopolis, os proprietarios, commerciantes e pessoas que têm interesse nesta cidade deixem de concorrer para esta utilissima, indispensavel e inadiavel reconstrucção?
   Queremos crer que não.”